A tarde chegava ao fim, o vento começava a refrescar o dia quente, os pássaros começavam a chegar pousando ainda timidamente nos galhos da braúna. Ao longe se ouvia um barulho peculiar para quem era andarilho na região. Era de uma sanfona, mas a música ninguém podia identificar.
O som indefinido se aproximava convidando curiosos e ouvintes que já sabiam quem era o tocador, quem não conhecia Pedro Lula, andarilho, considerado louco por andar esmolambado, despenteado e com apregatas desatadas batendo nos calcanhares tirando a poeira da terra seca do sertão.
De longe dava para perceber a alegria de Pedro Lula, parecia que estava preparado para um grande show, os convidados começavam a sentar-se nas raízes da braúna e em tamboretes trazidos da casa grande para acomodar andarilhos em seus breves e necessários descansos.
Pedro Lula por fim chegava aproveitando a sombra da grande braúna, seu sorriso demostrava sua grande euforia, seu arrasta pé levantando a poeira, seus braços segurando a sanfona com cotovelos abertos como se realmente fosse um grande tocador, mas sua sanfona estava furada e nunca dava para completar uma nota ou cantar uma música de Luiz Gonzaga o qual sempre falava que foi seu Professor.
Pedro Lula não desistia de fazer seu pequeno show, tirava de suas costas um grande saco de estopa que muitas vezes era confundido por crianças da região com o papafigo, terrível velho com um saco de estopa que pegava crianças para tirar-lhe os fígados o qual era seu alimento precioso.
Do saco esmolambento Pedro Lula tirava outros instrumentos que misturava com som rouco da sanfona, quem acreditasse que a música não era tocada acabava transportados pelas asas da imaginação ao mais sublime dos sonhos e ficava de queixo caído, pois Pedro Lula tirava do saco doze latas de olho vazias, continha pequenos furos e dentro pedras de diversas formas e tamanhos.
O tocador alinhava as latas pegando uma a uma e balançando ao pé do ouvido para se certificar do som produzido por elas, após todo ritual começava a tocar, inicialmente gerava dúvida, mas quando se prestava bastante atenção começava-se a ouvir a música que ia ficando clara, suas mãos rápidas balançava uma lata após outras e a quantidade de pedras das latas produzia o som e o ritmo, com mais rapidez ainda puxava seu fole de uma nota só que combinava com o ritmo acelerado dos movimentos das latas, quem quisesse podia até dançar ou acompanhar a música com palmas, pois ali debaixo da grande braúna em um entardecer começava uma festa, os pássaros já em grande quantidade na copa da braúna começavam a cantar.
Sentado em um tamborete eu ficava a imaginar como a alegria, a felicidade e o companheirismo podem transformar as pessoas, aqueles desvalidos debaixo da braúna não passavam de andarilhos, pedintes, errantes, excluídos pelo o estado e a sociedade de padrões elitizados e religiosos, mas não deixavam de sonhar por dias melhores e quando se encontravam não faziam altivez de raça, cor e religião, apenas sorriam e cantavam para espantar suas dificuldades e o descaso social.
Léo Pajeú Léo Bargom Leonires
Enviado por Léo Pajeú Léo Bargom Leonires em 15/03/2011
Alterado em 02/06/2011