A DEUSA E A SERPENTE DO LAGO PARANOÁ
O final da tarde anunciava que a noite ia ser boa para pescar, lua nova, o vento bom, temperatura ambiente e algumas nuvens no céu para deixar um papel de parede como fundo no céu em contraste com o lago. João Neves tinha conferido as iscas, os anzóis e outros apetrechos que carrega para pescaria. André o esperava a beira do caminho já ansioso como se tivesse compromisso com os peixes.
Hoje a pesca seria um lugar mais deserto do lago, havia algumas histórias assombrosas deste lugar, mas João Neves já tinha pescado em tantos lugares do lago que nunca se importara com estes comentários. André já pensava diferente, apesar de ser companheiro de pesca, sempre estava com medo ou receio de quer alguma coisa poderia acontecer.
Após uma boa caminhada João Neves encontra André, como sempre ansioso e preocupado com a pescaria.
- Tudo bem André, vamos andando que não podemos perder tempo, temos que chegar naquele lugar que ainda não fomos, acho que vamos pegar mais peixes que qualquer outro dia. – Diz João Neves, companheiro de pesca e antigo morador das proximidades do Lago Paranoá.
- Tem certeza que hoje vamos pescar lá, desde que você me falou deste lugar só escuto histórias assombrosas e me arrepio todo. – Diz André meio receoso.
- André, isto é história de pescador antigo, eles inventam esses contos misteriosos para afugentar outros pescadores dos melhores lugares para pescar que existe aqui no lago. – Diz João Neves tentando acalmar André.
- Sei não João Neves, tem gente que não arrisca ir lá e olha que conheço muito pescador aqui. – Comenta André mostrando medo em sua fisionomia.
- Esses pescadores feitos nas coxas, não tem coragem de pescar a noite como nós, eu imagine ir lá onde se escondem tantos peixes que não vamos dar conta de trazer, temos que voltar outro dia para pescar mais. – Diz João Neves tentando animar André.
- Tudo bem, mas hoje estou com mau pressentimento, espero que a pescaria ocorra tudo bem e voltemos mais breve possível. – Diz André com voz calma.
- Deixa de besteira, pensa positivo que tudo vai dar certo. – Diz João Neves esboçando um sorriso.
A noite chegou rápido enquanto os dois pescadores caminhavam pela beira do lago, os grilos já faziam serestas, morcegos faziam voos rasantes e duas corujas piavam pertos de suas tocas.
A trilha ia ficando estreita dificultando a passagem, com os braços João Neves e André iam afastando alguns galhos para caminhar com cuidado. Um biguá negro como a noite emerge do lago e faz um voo rasante em direção de João Neves e André ecoando um grito não comum assustando-os. André com o susto cai e escorrega na terra arenosa enquanto João Neves tenta segura-lo sem êxito.
Após o acontecido tudo para por um instante, grilos se calam, corujas desaparecem e a noite fica em silêncio. André levantando-se, batendo a sujeira da calça, espantado arregala os olhos e fica paralisado. João Neves tenta disfarçar, mas também fica olhando em sua volta para analisar o acontecido e acalmar André.
- Fica tranquilo André, foi só uma queda, nada mais. – Diz João Neves tentando acalmar André.
- Você viu aquele monstro que saiu do lago? Quase me pegou? – Diz André assustado.
- Que monstro André, era apenas um biguá pegando um peixe. – Diz João Neves tentando deixar André mais calmo.
- Mais esta hora da noite, isto é mau agouro, biguás não pegam peixes uma hora dessas. – Responde André assustado.
- Fica tranquilo, volta aqui para a trilha, vamos seguir, falta pouco. – Fala João Neves tentando fazer com que André esqueça o acontecido.
- Acho melhor a gente voltar, isto foi um aviso, meu pai sempre falou para prestar atenção nos avisos da natureza, alguma coisa vai acontecer. – Diz André tentando convencer João Neves a voltar dali.
- Deixa de ser mole, foi apenas um pássaro, vai ficar com medinho de um biguá. – Diz João Neves tentando encorajar André.
- Tudo bem, mas se acontecer mais alguma coisa eu volto, se você quiser que vá sozinho. – Avisa André com receio da pescaria.
- Tudo bem medroso, agora vamos logo que os peixes estão nos esperando. – Diz João Neves com um sorriso para animar André.
Olhando receoso para os lados André segue atrás de João Neves que continua afastando os galhos retorcidos da trilha segurando a lanterna para clarear o caminho que fica mais difícil de andar. Após afastar um grande galho a sua frente João Neves percebe que bem a frente tem alguém sentado em uma pedra. Para não assustar André João Neves começa a andar bem devagar até chegar bem perto do espectro sentado na escuridão da trilha.
O espectro vira seu rosto bem devagar revelando sua aparência. João Neves foca a lanterna em seus olhos e fica aguardando algum diálogo. Com voz rouca e grave o velho começa a falar:
- O que vocês estão fazendo aqui? – Diz o velho com voz altiva.
- O que o senhor acha, estamos com varas de pescas e iscas na beira do logo, o que será que vamos fazer? – Diz André com deboche.
- Pois hoje não é uma boa noite para pesca é melhor vocês voltarem ou ir pescar em outro lugar. – Diz o velho com olhar sério.
- O senhor acha que vai nos assustar e ficar com esta parte do lago e com os melhores peixes, pois fique sabendo que estamos aqui para pescar e vamos pegar nossos peixes depois vamos embora, tem para todo mundo. – Diz João Neves estufando o peito com orgulho.
- Escuta o velho João Neves, vamos ouvir o que ele tem para nos dizer. – Diz André com medo.
- Fica tranquilo André, este senhor não vai nos assustar. – Diz João Neves provocando o velho.
- Meus filhos! – Diz o velho com calma. – Hoje ela vem para brincar aqui com sua serpente, é melhor vocês partirem. – Continua o velho a explicar mantendo a calma.
- Que estória é essa, quem vem aqui, o que você estar inventando para nos assustar, saia da minha frente que tenho que pescar. – Diz João Neves já irritado com o velho.
- João escuta o velho, alguma coisa estranha vai acontecer, vamos embora, olha acho que é o terceiro aviso. – Diz André em pavor.
- Vai acontecer nada André, fica calmo, este velho que nos assustar para pescar sozinho. – Diz João Neves sem se convencer com a história do velho.
- Meus filhos, eu já avisei, agora é com vocês, tenho que ir, boa sorte. – Diz o velho desaparecendo em seguida num piscar de olhos.
- João, vamos embora logo, sinto que algo vai acontecer, é melhor sairmos daqui o mais rápido possível. – Diz André puxando João Neves pelo braço.
- Deixa de ser medroso, vou é colocar meu anzol, pegar um peixe para você ficar mais tranquilo. – Diz João Neves ajeitando a isca no anzol.
Com todos os acontecimentos o tempo passou e já era quase meia noite quando uma pequena onda vinha cruzando o lago. A luz da lua estava encoberta por uma nuvem pesada e não dava para saber o que vinha se fosse um peixe era grande, pois a onda vinha aumentando enquanto se aproximava da margem.
André arregalou os olhos e assustado tentando fugir, mas João Neves se recusava a sair da margem aguardando para ver o que era. A nuvem com se fosse capricho da natureza deixa passar um raio lunar que reflete no lago revelando a onda que aumentava cada vez mais.
Uma linda mulher morena, cabelos negros com vestes encobrindo apenas as partes íntimas começou a emergir do lago como se estivesse em uma prancha de surf. A onda foi ganhando força e aumentando a batida da água nas margens. Com a proximidade a margem a mulher se revelou por inteira, mas a onda aumentava cada vez mais. Com a luz da lua agora mais intensa uma grande serpente surge das águas transportando a mulher que parece ser íntima da fera.
Sem poder fazer nada ou se mexer, João Neves e André ficam paralisados enquanto a grande serpente e a mulher brincam nas águas do lago sob a luz do luar. João Neves larga a vara de pesca e começa a sair da margem indo de encontro a André que se escondia atrás de uma pequena árvore. Os dois ficam ali por algum tempo paralisados vendo aquela cena como se estivessem encantados.
Uma ansiedade tomou conta de André que se encantou com a mulher, seu olhar se voltava apenas para a linda morena que flutuava no lago. João Neves percebeu que alguma coisa estava acontecendo quando André saiu de trás da pequena árvore e começou a andar em direção a margem do lago com se estivesse encantado. João Neves tentou segurar e puxá-lo, mas não conseguia.
André agora se encontrava a margem do lago olhando a linda mulher e a serpente que cortava a água em ziguezague fazendo ondas para todo lado. João Neves vendo aquela cena ficou atônito e sem ação.
Um assobio longo ecoou intenso, as nuvens encobriram o firmamento e as águas do lago se acalmaram repentinamente. Com uma visão privilegiada João Neves viu quando a serpente se voltou para a margem com a mulher sobre seu corpo equilibrada com se fosse costume natural ou realmente uma ação sobrenatural.
André parado a margem encantado com a mulher fica paralisado enquanto a serpente se aproxima vagarosamente como se sua presa estivesse lhe aguardando. João Neves tenta gritar, mas sua voz não sai, tenta se mexer, mas não consegue, sua única ação é ver quando a serpente chega bem perto de André e o engole por inteiro sob o olhar preciso da mulher que sorrir e faz com que a fera volte para a parte funda do lago mergulhando em seguida deixando apenas uma grande onda que vai se desfazendo com o passar do tempo.
João Neves fica alguns instantes sem se mexer até ouvir novamente a voz do velho que aparece de repente e lhe diz:
- Eu os avisei, seu amigo entendeu os avisos, mas você com sua ignorância não atendeu os apelos da natureza, agora você vai ter que conviver com isto e ninguém vai acreditar em sua história, diga que ele se afogou, a carcaça do corpo de seu amigo em breve estará junto a Kombi que afundou e se encontra na parte mais funda do lago, mas diga para os mergulhadores não se aproximarem dos escombros na casas que foram engolidos por estas águas há tempos atrás, pois lá naquelas águas escuras e cheias de lixo a serpente e a deusa do lago descasam em paz. – Explicou o velho. – Não venha mais pescar aqui neste lugar e avisa a todos que neste local não tem peixes, se alguém vier terá o mesmo destino do seu amigo, a morte. – Disse o velho sumindo novamente assim como apareceu.
João Neves desolado vagou pelo o resto da noite sem chegar a lugar algum até o sol brilhar e revelar a direção que queria ir. Cansado e desorientado João Neves caminha sob sol forte da manhã tentando descobrir o que aconteceu na noite anterior sem aparecer qualquer lembrança em sua mente. Apenas a imagem de Brasília que lhe é revelado diante da luz alaranjada o qual revela os monumentos da capital.
Léo Pajeú Léo Bargom Leonires
Enviado por Léo Pajeú Léo Bargom Leonires em 27/09/2012
Alterado em 10/10/2012