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LÉO PAJEÚ LÉO BARGOM LEONIRES
Poesias e Contos, Sentimentos e Versos, Sonhos e Visões de um Premonitor.
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Textos
UMA CARREIRA DE MILHO


         Era muito jovem, quero dizer, ainda um menino, mas no sertão, essa fase se confunde, pois começamos a trabalhar para sobreviver muito cedo. As poucas crianças que tinha o direito a estudar, digo direito, por que a grande maioria não tinha o mínimo para ir para a escola, digo o básico do básico, uma roupa, um caderno, um lápis. Mas, eu tinha esse direito, minha mãe era Professora do município, então eu tinha esse direito, apesar de ter um caderno muito simples, um taco de lápis, digo um taco, por que minha mãe comprava um lápis e dividia pra mim e meu irmão, era assim todo vez, a gente cobria o pedaço quebrado com uma borracha e pronto, se alguém perguntasse, a gente dizia que escrevia muito e aí já estava acabando o lápis, era simples assim.
          Como eu disse no início, a criança se confunde com um adolescente no sertão e tem que trabalhar cedo, então eu era o da vez, tinha que alternar meus estudos, minhas lições com a enxada. Fiquei ansioso mais para trabalhar do que para estudar, a gente começava geralmente a trabalhar primeiro depois a estudar. Nessa época tinha chovido muito, então a plantação de milho, feijão, melancia, jerimum, melão era grande, todos tinham que capinar, era uma missão importante no sertão em época de boa chuva, pegar na enxada cedo.
         No nosso sítio sempre vinha um velho senhor limpar o mato, era um grande frequentador das nossas roças, mesmo criança, entendia que ele era um velho, realmente muito velho para aquele serviço, mas no sertão quem quer sobreviver tem que se virar, seja velho ou seja criança.
         Pensando nisso logo me empolguei, ora trabalhar melhor que um velho daquele eu podia, apesar de ser criança, eu já sabia que tinha mais disposição, mais capacidade que um velho senhor. Como todo pensamento é torto e ideia perde o caminho, pensei logo em fazer um desafio, ora perder uma carreira de milho para um velho senhor daquele eu nunca perderia.
        No dia seguinte seria a grande capinação, era minha vez de mostrar que que podia ser melhor que aquele velho senhor, empolgado pedi ao meu pai uma enxada nova, dessas boas, que ainda vem com a cor e os nomes escritos nela, um cabo novo, isso era para está bem preparado para o dia seguinte. Notei que meu pai e o velho senhor trocaram olhares, notei um pouco de gozação naquela troca de olhares, mas já demostrava que o desafiava para a lida, então nem fiquei nervoso, no dia seguinte ia demostrar isso. Sabia que com minha juventude ia pegar uma carreira de milho e ia terminar muito antes que o velho senhor.
Passei um bom tempo afiando a enxada, medindo o cabo, era uma forma de pegar nele e melhor saber aonde segurar para capinar com mais eficiência, isso tinha imaginado, nunca tinha passado por isso, mas imaginava assim, então era uma estratégia, já tinha afiado a enxada, medido o cabo, agora era dormir e aguardar a capinação, nessa época sempre tinha muita comida, meu pai matava um bode, umas galinhas, minha mãe fazia muita comida, ia muita gente trabalhar na roça, era uma festa, geralmente cada um pegava uma carreira de milho e ia até o fim, voltava em outra e terminava a capina, isso levava uma manhã e uma tarde. A baixada era grande, era quase uma légua de carreira de milho, com feijão, melancia, jerimum e melão em suas covas, isso eu não pensei, mas agora era tarde, tinha que colocar em prática meu plano, terminar a carreira de milho primeiro que o velho senhor.
         Quando acordei, logo fui tomar café, já tinha tudo pronto lá na cozinha de casa, café, café com leite, broa de milho, batata doce, mandioca, milho cozido, pamonha. Logo depois vi todo mundo chegando para tomar café, observei e não vi o velho senhor, então já estava em vantagem, tinha tomado meu café, minha enxada tava amolada, tava tudo bem pra mim naquele dia.
         Antes de sair para pegar minha carreira de milho para capinar, observei que o velho chegava devagar com sua velha enxada nas costas, parecia tranquilo, mas seu olhar me fez acreditar que topava o desafio, ele sabia que eu estava ali para tentar ganhar, então apenas sorriu, foi tomar café e afiar a enxada, parecia inacreditável, mas enquanto todo mundo ia começar a capinar em suas carreiras de milho o velho senhor ainda ia afiar sua enxada, aquilo parecia provocação, mas não era uma competição de verdade era apenas um desafio e eu queria mostrar que era capaz de fazer melhor que ele.
         Afoito, comecei a capinar, parei um pouco, olhei para aquela carreira de milho, parecia não ter fim, mas agora não dava para voltar atrás, tinha que ir em frente e terminar. O velho senhor ainda estava lá, afiando sua enxada, parecia não ter presa, todo mundo já estava levantando a poeira, cortando berdoégua, bredo e capim nas carreiras de milho e ele lá tranquilo.
Depois de algum tempo o velho senhor começou sua lida, não parecia ter presa, mas em pouco tempo já se ouvia o barulho de sua enxada perto de nós, não dava para acreditar, ficou tanto tempo tomando café, afiando a enxada e agora já estava ali perto de nós. Acabou a parte da manhã e a carreira de milha ainda parecia toda ali, sem capinar. O velho senhor não parava muito, parecia sincronizado com a enxada, também não parecia cansado, nós, já não tínhamos mais fôlego, aí paramos para almoçar, o velho ainda ficou mais um pouco, parecia querer compensar o tempo que ficou parada pela manhã, enquanto a gente saia para comer.
         Depois do almoço pegamos de novo na lida, o velho senhor ficou para trás, deitou um pouco na rede e foi pitar um cigarro de palha, não parecia preocupado com o resto da carreira de milho para terminar. Notei que o velho senhor tinha chegado junto a nós em sua capina, então tinha que andar logo se quisesse ganhar dele nesse dia. Depois de algum tempo o velho senhor chegou e começou a capinar, eu já não aguentava mais, tava cansado, com calos na mão e o corpo ardendo do sol, o velho parecia tranquilo, capinava em um ritmo incrível, parecia uma música enquanto puxava a enxada e arrastava a apragata no chão, se aparecesse uma sanfona dava para começar um xaxado, um arrasta pé ali naquele milharal.
         Foi chegando o fim da tarde e nada de terminar minha carreira de milho, olhava para os outros e todos estavam assim como eu, cansado e sem reação. O velho senhor vinha ali bem devagar capinando com se tivesse dançando, era um ritmo só, sei que chegou o fim da tarde e ninguém terminou sua carreira de milho, apenas o velho deu por terminado sua tarefa, era incrível, mais eu não aguentava nem ficar em pé, mas o velho, esse sim, parecia disposto. No final do dia apenas uma um carreira de milho tinha sido capinado, curioso procurei o velho como tinha feito isso, ele calmamente me falou: “Filho nesse mundo o que vale é a experiência, o cálculo, a paciência e o ritmo da vida, se não nos atentamos para isso, vamos trabalhar mais, refazer mais as tarefas, por que não calculamos e medimos antes, sem paciência não veremos as soluções que aparecem durante nossa tarefa e o ritmo é importante para dosar nosso gasto de energia, não podemos gastar tudo antes de determinar nosso objetivo, entendeu. Não duvide de ninguém por causa da idade, tamanho e de sua aparência, todo resultado é uma consequência de atos, temos que ter muita paciência para sincronizar nossa vida e viver a medida que Deus nos deixou, não podemos usar essa medida antes do tempo determinado por ele, entendeu. Seja paciente, a vida não é uma carreira de milho.
Léo Pajeú Léo Bargom Leonires
Enviado por Léo Pajeú Léo Bargom Leonires em 28/11/2017
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